Se para deixar o vício de fumar, cinco dias de intensivo curso às vezes são suficientes, para romper com o vício da maledicência muitos dias mais seriam necessários, tanto é este vício mais insidioso e maligno que aquele. Verdadeiramente, maledicência é vício, mais vício que o alcoolismo e o tabagismo. Pelo menos, parece muito mais fácil vencer o álcool e o fumo que vencer a tendência mórbida e diabólica de criticar a vida alheia! Exagero? De maneira alguma!
Tenho visto ébrios sem conta tornarem-se sóbrios e fumantes inveterados, aos magotes, romperem as algemas que os escravizavam; porém, quanto estamos informados são pouquíssimos os faladores contumazes que triunfam sobre a nauseante maledicência. Não exageramos ao dizer que apenas um de vinte mil alcança completa vitória. Pensando nesses sofredores infelizes que vegetam à sombra de quase todas as igrejas e que no íntimo anseiam pela libertação, e pensando nos imensos prejuízos que os tais têm causado a si mesmos, à obra de Deus, e a todos quantos têm a desdita de comungar com eles os mesmos horizontes, foi que senti-me inspirado a organizar este curso, que, modéstia à parte, é a última palavra sobre o assunto, posto ser intensivo, prático, de fácil compreensão e sobretudo, apoiado nas advertências divinas, que não deixam dúvida quanto ao destino daqueles que se alimentam do pecado do povo de Deus.
Como todo o curso, porém, este também precisa ser seguido à risca para que os resultados sejam satisfatórios.
Não é fácil abandonar um hábito que já faz parte do caráter! Não é fácil cortar de vez o veneno, que através dos anos foi adicionado ao sangue do toxicômano. Não é fácil domar uma língua desenfreada, qual viveu sempre à solta, sem nunca ter sentido o efeito salutar de merecidas férias!
É possível recuperar o mais empedernido viciado, mas, quanto ao falador venal. . . que se estriba em sua santidade farisaica, para do alto de suas pretensões viver de dedo em riste, acusando e criticando todo o mundo. . . a esperança de recuperação é mínima. Como, porém, cremos em milagres e como tudo é possível para aquele que crê, vamos fazer a tentativa!
Se não conseguirmos libertar de todo os casos graves e crônicos, temos a certeza de que muitos que ainda não ultrapassaram os limites da misericórdia divina se beneficiarão com este curso.
O desabrochar da tendência para ver o lado bom das coisas e das pessoas bem como uma diminuição considerável de palavras más, de resmungos e observações maldosas, eis alguns dos resultados imediatos que poderão afinal conduzir o viciado para fora do submundo asqueroso, em que vive aquele que espalha contenda entre os irmãos! Vamos pois, com ânimo, coragem e fé, aproveitar este arrazoado, para romper de vez com este hábito pernicioso que tanta infelicidade tem carreado para o povo de Deus.
Aí vem o irmão X do seu longo giro para se desincumbir da tarefa que lhe confiamos. Vejamos como foi aceito o curso pelo nosso povo.
— Então, irmão X, como foram as matrículas?
— Pastor a coisa não foi muito fácil! Falar todo o mundo fala mas ninguém quer ser classificado como falador. Matricular-se num curso desta natureza é confessar publicamente que tal pessoa se encontra contaminada pelo mal. Daí o senhor pode calcular o enorme trabalho que tive para conseguir alunos. Todavia depois que os mais corajosos se inscreveram, o povo perdeu o medo! Aqui estão os resultados! Veja estas fichas!
— Hum, irmão X, é mais gente do que eu calculei! E. . . estes, também se matricularam?
— Pastor, capriche! Vai a milhares o número de seus alunos e há muita gente boa matriculada. Não sei como o senhor se arranjará para libertar toda essa gente em apenas cinco dias! O senhor não acha que o tempo é escasso?
— Irmão X, quem gastou anos e anos usando sua língua para maldizer e criticar a não ser que se converta, jamais se libertará desse pecado! Eu, com este singelo curso viso apenas despertar do sono esses falsos cristãos, que a nossa frente são almas generosas, mas, a distância, por detrás, são canibais implacáveis, que destroem e matam sem piedade! Se com todo meu esforço conseguir arrancar um só que seja deste lamaçal, considero-me bastante recompensado e a Igreja será enormemente beneficiada.
— Pastor, eu não tinha idéia da gravidade deste pecado. Sempre pensei que criticar e falar mal da vida alheia fosse coisa sem importância, um passatempo agradável, sem maiores conseqüências; mas depois que andei lendo o que diz o Espírito de Profecia em Testemunhos Seletos, Vol. 2, págs. 19-21, percebi que atrás do rasteiro disse-que-me-disse existem pecados ainda maiores! O senhor já leu este trecho?
— Li, irmão X. Este, e outros trechos do Espírito de Profecia me con-venceram que ou nós como um povo vencemos este pecado, ou este pecado nos aniquilará. Fato é que a salvação é individual e que cada um terá que dar conta de si mesmo a Deus. Mas este pecado é tão virulento, que não dana apenas aquele que o pratica. Os que ouvem o falador, os que em silêncio assistem o festim dos antropófagos consentem com o mal e são participantes da retribuição.
— Bem irmão X, já conversamos demais. A classe está ansiosa, espe-
rando a primeira lição. Sente-se aqui neste cantinho e assista em silencio as aulas que se seguirão.
Iniciaremos hoje, propriamente, nosso Curso Como Deixar de Falar da Vida Alheia. Serão dias de meditação, de jejum e oração pois esta casta de demônios não se expulsa apenas com argumentos.
É necessário que haja profundo arrependimento e genuína conversão para que esta erva má seja estirpada de nosso meio pela raiz.
Um homem jamais deixará de usar sua língua para o mal para açoitar os seus conservos, enquanto não nascer de novo no reino de Deus. O velho homem é sempre mau, esteja êle adornado com a aparência de piedade ou vestido de andrajos em sua simplicidade brutal! Mau de obras, mau de pensamentos, mau de palavras, mau de intensões, mau, continuamente mau! E o pior de tudo é que esta maldade é comunicativa.
“Os ímpios são como o mar bravio que se não pode aquietar e cujas águas lançam de si lama e lodo,” esborrifando sujeira nos que se encontram próximos, como nos mais afastados e distantes.
O ímpio tem prazer em propagar as faltas que descobre num irmão, como quem se alegra ao saborear um delicioso manjar. Se, porém, não as descobre, cria-as na imaginação como o fêz no Céu, o rei e pai da mentira, patrono e protetor de todos os boateiros.
— Pastor, com licença! Este tipo de pessoas existe na Igreja ou o senhor está se referindo ao ímpio que não conhece a Deus?
— Irmão X, na Igreja existe de tudo. A rede do Evangelho apanha peixes bons e maus e os traz a todos para o mesmo barco. Ninguém deve se escandalizar com isto! Esta é infelizmente, uma verdade várias vezes repetida nas Escrituras. O joio medra exuberante em meio ao trigal e os lobos se disfarçam em mansas e humildes ovelhas!
Acompanha hoje, o povo de Deus, em sua jornada para o Céu, como sempre o acompanhou através da História, uma mistura de gente, como aquela que acompanhou a Israel em sua jornada para Canaã; mistura de homens e mulheres que se envolvem com o pecado, eternos descontentes, murmuradores profissionais, caluniadores, atrevidos, desafeiçoados, implacáveis, sem domínio de si mesmos, cruéis, irreconciliáveis, que aprendem sempre sem jamais chegar ao conhecimento da verdade, tendo a aparência de consagração, para lhes servir de capa. (II Tim. 3:16.)
Estes são os que causam dissensões nas igrejas, resingões, hábeis curtidores de toda a espécie de raiz de amarguras, mestres em embalsamar e mumificar rancores e ressentimentos que resistem por gerações! Metalúrgicos especializados em fundir palavras abrasivas, temperadas e retemperadas na bigorna incandescente do despeito e da inveja. .. sempre dispostos a voltarem ao ponto, de onde nunca, jamais partiram, junto das panelas de carne e da idolatria do Egito.
Oh! Como nos alegraríamos neste Caminho e como faríamos estremecer a Terra se entre nós houvesse mais pessoas que soubessem escrever na areia os pecados de seus irmãos! E, quantas pedras cairiam das mãos dos modernos fariseus que insistem em purificar a Igreja atirando pedras e espargindo lama se pudéssemos ouvir o Senhor perguntar outra vez: “Onde estão os acusadores? Onde estão os santos, carregados de pedras? Onde estão os pseudo-reformadores que se alimentam do pecado do Meu povo e da maldade dele tem desejo ardente? (Oséias 4:8).
Senhor! Os acusadores, os santos carregados de pedra estão por aí espalhados entre os publicanos e pecadores, prontos a qualquer momento para apedrejar. Eles vêm à igreja, cantam e oram melodiosamente, mas trazem pedras nas mãos! Às vezes, chegam a ser estritos guardadores do sábado e dizimistas sistemáticos, mas não deixam de atirar pedras. Muitos deles, são ardorosos missionários e até percorrem o mar e a terra para fazer um prosélito e, depois de o terem feito, o fazem duas vezes mais filho do inferno do que eles mesmos o são (S. Mat. 23:15) porque lhes ensinam a tática diabólica usada pelo acusador dos irmãos: a tática de atirar pedras!
Eles estão por aí Senhor, erguendo aos céus mãos santas. . . carregadas de pedras sem saber que em vão Te adoram cegados pelo grande pecado da desumanidade do homem para com o homem. Enquanto parecem seguir princípios rijos como os dos puritanos e conservam uma aparência de santidade mais esmerada que a dos fariseus, levam pedras nas mãos para apedrejarem os pecadores! São homens e mulheres que conhecem a Bíblia, e se ufanam de pertencer ao Teu povo! Doutores da lei, versados em todo o conhecimento da dispensação mosaica para os quais a misericórdia é fraqueza e o perdão um aviltamento.
A estes, e a todos quantos chegam aos lábios a taça asquerosa da difamação e da maledicência, dirigimos humildemente este curso, na esperança de salvar alguns.
Decorem as seguintes passagens bíblicas para serem repetidas às refeições que virão naturalmente, após o jejum dos dias do curso. “Põe, ó Senhor, uma guarda à minha boca; guarda a porta dos meus lábios.”
Sal. 141:3. “O que guarda a sua boca conserva a sua alma, mas o que muito abre seus lábios tem perturbação.” Prov. 13:3.
Levante cedo e abra as janelas do entendimento para meditar nas seguintes grandes verdades:
- Pessoas superiores falam sobre princípios.
- Pessoas medianas falam sobre coisas.
- Pessoas inferiores falam sobre pessoas.
Cada um deve localizar-se, mediante acurado exame de consciência para saber em que faixa está operando.
- Superior?
- Mediana?
- Inferior?
Para fazer o curso é indispensável ser inferior, isto é, o curso destina-se aos grandes faladores. Os sãos não necessitam de médico e sim os doentes ( S. Mat. 9:12).
Pelos nossos cálculos, medindo as ondas. . . de boatos, sobe a milhares o número dos que vivem vida inferior. Se você é um deles, coragem! Nós estamos tentando empurrá-lo para cima! Coopere conosco! Não desista agora! Mais um pouco e você será outra criatura!
Passe o dia em profunda meditação analisando o papel que o falador desempenha na sociedade e na igreja.
Nós dizemos que a língua é um grande mal mas na realidade o mal está na cabeça, no entendimento. Do que há em abundância no coração (na mente) disto a língua se ocupa. (S. Mat. 12:34). Façamos pois um gargarejo de malva dos pensamentos adoçados com assuntos novos mais interessantes que as falhas e defeitos do próximo.
Leiam muito hoje. . . e sempre. Leiam pelo menos um livro por mês, além do estudo da lição e da leitura da Bíblia. “Mente vazia é oficina de Satanás.” E.G.W.
Não se esqueçam, porém, que apenas a cultura não evita o disse-disse. Existem grandes intelectuais cujas línguas cortam como navalha! A cultura só abranda a fera que há no homem se santificada pela verdade. Cultura sem Deus, estufa, envaidece e costuma criar as piores espécies de maldizentes que conhecemos. Cuidem bem disso! É preferível ser um maldizente ignorante a ser um maldizente culto. A ignorância limita o campo de ação e tem a vantagem de não merecer muito crédito. No primeiro dia, como também nos demais, não façam e nem recebam visitas. Isolem-se! Até aprenderem a ver o lado bom das coisas e das pessoas!
Pensamento:
Pode ser que seja duro mas estou decididamente resolvido a deixar de falar da vida alheia.
Procurem ir para cama cedo, ao anoitecer. Durmam pelo menos doze horas por dia! Se todos os faladores dormissem bastante, nosso pobre mundo teria mais paz! Voltem amanhã ao romper da aurora! Enquanto vocês dormem, nós estaremos trabalhando para lhes mostrar um caminho mais excelente, onde cessam o ruído das línguas e o crepitar das metralhas envenenadas.
Ctrl C by Sétimo Dia, por Pr. Benito Raymundo, publicado parcialmente nas edições de Fev/ Mar/ Mai / Ago de 1972.
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