sexta-feira, 1 de maio de 2009


O Troféu Talento é uma premiação anual concedida pelo meio evangélico (músicos, produtores, ouvintes) aos "melhores do ano" na música gospel brasileira. Algo semelhante ao Dove Awards (prêmio evangélico americano), que já é inspirado no Grammy (prêmio da indústria fonográfica dos EUA). Estabelecer uma competição entre os cantores e aficionados seria algo "religiosamente" correto? Ou, no mínimo, seria realmente necessário um prêmio aos "melhores"? Isso tem a ver com a urgência do evangelho ou com as premências do mercado?
Criado em 1996, pela Rede Aleluia, o prêmio conta com a interatividade por meio da participação votante do público por telefone e pela internet. Para Samuel Modesto, coordenador do Troféu Talento 2008, a premiação dos melhores da música gospel é uma forma de reconhecer “o talento que Deus dá aos adoradores e cantores; é um reconhecimento ministerial e profissional” (Backstage, ed. 164).
Esse entrelaçamento da atividade musical religiosa com a atuação do mercado deixou de ser um modo de operação comum e, sim, necessário (os cristãos precisam adquirir bens religiosos), e se tornou uma estratégia de consolidação comercial que se justifica pelo "reconhecimento do talento". Como exemplo, a ficha de votação do Troféu Talento descreve a categoria Cantor do Ano como o “prêmio concedido ao cantor que alcançou grande destaque na mídia e com a execução de sucessos no ano de 2008”.
Quanto às categorias Intérprete Masculino e Feminino, o eleitor deve considerar "os quesitos qualidade vocal, postura corporal, presença de palco e simpatia". Há também a categoria "Destaque", em que "devem ser avaliados os critérios de resultados em vendas, execução musical e destaque na mídia".
Alguns poderiam apontar o cumprimento das palavras do filósofo alemão Theodor Adorno, que há mais 50 anos escreveu que o processo de industrialização da música levava o público a confundir qualidade musical com sucesso comercial. Claro que se pode questionar o que seria essa qualidade e o quanto o público é realmente passivo na escolha de suas preferências musicais. Mas a conversa vai além.
No final dos anos 90, até o bispo Edir Macedo ganhou o troféu. Foi com a coletânea "As preferidas do Bispo Macedo". Dá pra levar a sério essa premiação? Dá, sim. No sentido de que ela envolve quem terá mais suporte da gravadora, que estilo está sendo aprovado pelo público, compromete altas cifras.
As categorias específicas para a música gospel criadas pelo Grammy Latino são comemoradas pelo segmento evangélico. Segundo Yakima Damasceno, uma das representantes do Brasil na Academia Internacional de Músicos e Adoradores de Deus (ACIMAD), são patrocinadas viagens de artistas e produtores ao evento e acompanha-se todos os estágios da premiação. Os prêmios são vistos, também, como uma demonstração da “fidelidade de Deus” ao empenho e obediência dos cantores cristãos, como diz Aline Barros, premiada três vezes, à revista Backstage (ed. 164).
Na edição do Troféu Talento 2009, o quarteto Arautos do Rei receberam o prêmio de melhor grupo vocal pelo segundo ano consecutivo. Para a gravadora Novo Tempo, este prêmio é uma oportunidade para falar do amor de Deus (aqui). Marcos Witt, ícone internacional do gênero "louvor e adoração", disse uma vez que os prêmios são uma porta de entrada dos cristãos para testemunhar no mundo fonográfico secular.
Porém, alguns músicos, como João Barone (Paralamas do Sucesso), acham que a criação de certas categorias diminui o valor do Grammy Latino, por exemplo. Muitos músicos não-cristãos não apreciam a música evangélica. Principalmente quando essa música se cerca de ferramentas de divulgação típicas da mídia pop e luta para cristianizar/sacralizar esses modelos (marketing agressivo, tardes de autógrafos, propaganda de marcas, premiações).
Se alguém é cristão e um dia ganhar o Oscar, o Grammy, o Jabuti, seja o que for, que ele experimente falar do evangelho para uma plateia, cristã ou não. Todos já sabem que ele é evangélico, que sua música fala de Deus e seu amor, etc etc. Muita gente estará conversando, se levantando, outros contrariados por acharem o premio injusto. Ou seja, parece claro que o proselitismo é apenas uma justificativa educada para ganhar prêmios.
Onde estaria a diferença? Vejamos: há sites de gravadoras evangélicas - MK, Line Records - em que leio frases do tipo: este é o CD premiado em 2007; a cantora vencedora de dois Troféus Talento; a gravadora com mais premiações; e assim vai. Na questão marketing, é difícil haver gravadoras que não se utilizam dos prêmios para alavancar a venda de seus produtos. Talvez esteja aí a diferença. Uma postura é considerar um prêmio uma benção divina. Outra bem diferente é usar a "benção" para aumentar a vendagem do CD e do DVD.
Vídeo do quarteto recebendo o Troféu Talento
Por:Joêzer Mendonça
Mestrando em música na UNESP.

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